Dênis
Farias*
A educação ambiental legitimou-se como campo de pesquisa de intensa
produção no meio acadêmico. São diversos artigos, livros, anais de eventos,
dissertações, teses de doutorado, entre outras formas de divulgação científica
voltados para a educação no contexto da questão ambiental. Devido a isto,
surgem vários pontos de debate nesta área de pesquisa. Entre os temas
abordados, há um em específico que parece ser uma questão intricada: qual a
prioridade temática da educação ambiental?
"Ora, mas como assim? Parece evidente que o papel da educação
ambiental é conscientizar os alunos da importância da preservação dos seres
vivos, do uso racional dos recursos naturais, enfim, da busca pela
sustentabilidade!", declararia um iniciante no assunto. Mas, vamos um
pouco mais devagar.
Num pequeno livro do biólogo brasileiro Marcos Reigota denominado 'O
que é educação ambiental' (Ed. Brasiliense, 2009), o autor afirma que embora
estes temas biológicos sejam importantes, "o que deve ser considerado
prioritariamente na educação ambiental é a análise das relações políticas,
econômicas, sociais e culturais" (p. 13). E, já neste ponto a educação
ambiental ganha tons de debate político. Pois bem, esta é a educação ambiental
política, que se mostra como um modelo fortemente implantado no Brasil. Esta
tendência tem inspiração no pensamento pedagógico do educador brasileiro Paulo
Freire. Ademais, o patrono da educação brasileira é referência para outras
nomenclaturas de educação ambiental, a saber, ecopedagogia, educação ambiental
crítica, educação ambiental dialógica etc.
A despeito disso, há outra abordagem de educação ambiental. É o caso
da Alfabetização Ecológica, defendida pelo físico austríaco Fritjof Capra, que
está sendo apontada como modelo biologicista. A justificativa de estudiosos da
área que apontam esta tendência como biologizante é, de modo geral, a grande
ênfase dada à ecologia. Ou seja, a importância dada aos estudos das relações
naturais dos seres vivos entre si e com o ambiente físico enquanto "modelo
moral" para a sociedade humana. Ou seja, "vejamos a virtuosidade da
natureza, aprendamos com ela!", defenderia um alfabetizador ecológico.
Sobre este assunto há um interessante artigo do biólogo brasileiro
Philippe Pomier Layrargues intitulado Determinismo biológico: o desafio da
Alfabetização Ecológica na concepção de Fritjof Capra (publicado em 2002 no
periódico Tópicos em educación ambiental e apresentado em 2003 no II Encontro
de Pesquisa em Educação Ambiental na Universidade Federal de São Carlos). Neste
texto, além das considerações já abordadas acima, Layrargues conclui que a
Alfabetização Ecológica está em contra-mão com o modelo político de educação
ambiental em países como o Brasil.
Estamos às voltas, grosso modo, com dois modelos opostos. Seria uma
biologização ou uma politização das temáticas a serem priorizadas pela educação
ambiental. Portanto, estas abordagens não compartilham de algumas visões
básicas do aspecto ideológico da educação ambiental. No Brasil, esta
diversidade de perspectivas pedagógicas está debatida num livro coordenado por
Layrargues, publicado em 2004 e disponibilizado em meio eletrônico no site do
Ministério do Meio Ambiente, cujo título é 'Identidades da Educação Ambiental
Brasileira'.
Este debate repercutiu durante o 2º Congresso Nacional de Educação
Ambiental (CNEA) e 4º Encontro Nordestino de Biogeografia realizado em outubro
de 2011 na Universidade Federal da Paraíba. Durante uma das atividades do
evento em que se apresentavam alguns conceitos de educação ambiental, um dos
espectadores afirmou veementemente que esta grande quantidade de abordagens
está fragilizando a importância da educação ambiental. Na ocasião, outro
ouvinte tratou de defender a diversidade de tendências, afinal a hegemonia não
seria bem vista em setor algum. Publicações sobre o assunto e debates em
eventos reforçam a notabilidade desta questão.
Diante desse cenário, os professores e mesmo os alunos talvez fiquem
desnorteados. Demonizar um modelo ou sacralizar outro não parece ser uma das
medidas mais acertadas. Ao contrário disto, é importante reconhecer as
limitações, contribuições e posições das diversas perspectivas. Este debate
reflete, na verdade, no campo pedagógico, outra problemática: dos limites entre
Cultura e Natureza. Para avançar, é necessário desfazer estas fronteiras tão
enrijecidas por milênios de história humana. Isto é, há uma trágica posição do
homem entre sua condição biológica e sua grande potencialidade cognitiva e
social.
A questão está posta, compete a nós aceitarmos o desafio de superá-la.
E, especificamente, no campo pedagógico isto quer dizer que se deve
compartilhar tal enfrentamento com os alunos. O equívoco está em impor modelos
ideológicos. Afinal, estamos num período de transição. O que não se admite é
educação que privilegie uma admiração estática da história, mas sim que forme o
indivíduo capaz de pensar e atuar de acordo com as peculiaridades das
problemáticas do presente.
*é pesquisador do Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação Ambiental
(GEPEA), vinculado à Universidade Estadual de Alagoas (UNEAL). Artigo enviado
ao JC Email pelo autor.
fonte:
www.jornaldaciencia.org.br
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